Quando o telefone tocou, foi no mínimo inusitado, considerando-se como as coisas estão no mundo, e principalmente quando aquela voz soou do outro lado. A consciência de que havia alguém lá foi o que trouxe Rick de volta, como se o som funcionasse como um gancho capaz de içá-lo das profundezas sombrias do caos para algum lugar mais próximo a superfície dos seus pensamentos.
Mas o que parecia uma possibilidade de avanço, de segurança, acabou minando de vez a visão sublime de um porto seguro em meio ao reino infernal que envolve todos os personagens. Amy, Jim, Jacqui, Lori. Os mortos estavam ligando.
É claro que tudo não passou da mente de Rick tentando fazê-lo confrontar seus demônios, sobrepujar seus medos ou mesmo entregar-se a sua dor, abraçá-la, aceitá-la, e perceber que teria de aprender a lidar com a mágoa e com o remorso.
Todavia, algo concreto veio das conversas de Rick pelo telefone, um princípio sutil que se tornou plenamente palpável. Amy disse que eles estavam seguros, que estavam no único lugar seguro, porque estavam longe demais de tudo aquilo. Os mortos estão longe o suficiente. Os mortos estão a salvo, afinal, a única maneira de se estar seguro é estar morto.
Talvez Rick não se tenha dado conta disso, mas, se ele percebeu, essa perspectiva coberta pelo desespero foi sobrepujada pela visão da sua filha, viva e sadia. Talvez ela tenha sido de fato o que o salvou, a razão pela qual ele precisou voltar da imersão na loucura pura e visceral. Contudo, a calmaria parece que não vai durar. Caminhos estão sendo trilhados e as estórias estão começando a convergir. Podemos esperar um desfecho sangrento e, talvez então, o Rick fora de controle, brutal e perdido, possa ser mais necessário que o Rick pai, que tenta ainda alcançar o que restou da sua humanidade.
