Carol VS Morgan: Uma análise das filosofias opostas em The Walking Dead

Dentre todos os aspectos positivos apresentados na primeira metade da 6ª temporada de The Walking Dead, como a evolução cinematográfica e os diálogos menos forçados, talvez o melhor seja a introdução das filosofias apresentadas por Carol e Morgan. Para entender melhor o comportamento de cada personagem, é necessário lembrar os eventos na vida de cada um deles.

Carol Peletier

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Carol era uma dona de casa subjugada pelo seu marido Ed, que a agredia fisicamente e também possuía inclinações sexuais sobre sua própria filha, Sophia. Logo na 1ª temporada, Ed foi morto por um zumbi. A cena que mostra Carol se livrando do cadáver dele retrata todo ressentimento pelo tratamento abusivo. Na 2ª temporada, ela perde Sophia, o único ente que ainda lhe restava e, certamente, o que ela tinha de mais precioso.

Após isso, Carol, ainda mais fragilizada, começa a aprender a atirar e a usar armas brancas. Com o passar do tempo, tornou-se uma mulher determinada e forte o suficiente para abrir um cadáver a fim de se preparar para o parto de Lori. Escapar da morte como ela conseguiu, com a ajuda de T-Dog e Daryl, contribuiu para entender que numa sociedade pós-apocalíptica é necessário lutar por si e por quem ama, mesmo que isso signifique fazer coisas que ela não queria fazer.

A nova Carol incorpora tão bem esse modelo de vida que, quando Karen e David adoecem, ela os assassina em segredo para que a doença desconhecida não dizime a todos do grupo. Após alguns acontecimentos, Carol é colocada em mais um dilema, encontra Mika morta pela sua irmã Lizzie, que começou a ver os zumbis como amigos. Portanto, em conjunto com Tyreese, Carol decide que Lizzie não pode conviver com outras pessoas e ela mesmo a executa.

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A cena e as palavras de Carol anteriores a morte de Lizzie mostram que sua ação foi baseada numa necessidade e não no sadismo ou algo do gênero. Sua atitude por ser vista como adepta do utilitarismo no qual um ato deve ser realizado com o intuito de propiciar felicidade ou bem ao maior número de pessoas. Tanto queimar Karen e David, quanto matar a garotinha, não foi realizado por prazer, mas sim com o objetivo de preservar mais vidas.

Morgan Jones

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Morgan apareceu bem menos na série, o que não significa necessariamente que seu arco não seja bem desenvolvido. Aliás, é feito brilhantemente, com grande contribuição do excelente episódio “Here’s not here”. Ele e seu filho Duane foram os primeiros personagens a interagirem com Rick após o coma. Foi dessa forma com que ele foi inserido na série, sendo que sua esposa acabara de tornar-se um zumbi e Morgan não tinha coragem de matá-la. Este foi o motivo da morte do seu filho e, consequentemente, o seu trauma; que o fez matar tudo o que visse a sua frente, independente se os indivíduos tivessem boas intenções ou não. No final da quarta temporada, o perturbado homem reaparece, no entanto, de forma pacifica e com a filosofia que “toda vida é preciosa”.

Não é possível enquadrar esse modo de pensamento de Morgan em uma teoria ética como o de Carol, entretanto, ela tem algumas semelhanças com o kantismo: “Age externamente de tal maneira que o uso livre do teu arbítrio possa coexistir com a liberdade de todos segundo uma lei universal”, que é, a grosso modo, quase uma generalização do “trate teu próximo como gostaria de ser tratado”. Embora, seu modo de agir não tenha especificado ainda a metodologia que iria utilizar para tentar recuperar o Lobo, restando, apenas, o bom exemplo do Eastman, que era um psiquiatra forense.

Conflito de ideias

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No segundo episódio da 6ª temporada de The Walking Dead, a diferença de pensamento fica evidente quando Carol e Morgan são os principais defensores da Alexandria no momento que foi atacada pelos Lobos. Ambos os pontos de vistas tem seus pontos positivos e negativos.

O princípio da utilidade, usado por Carol, e fortemente enraizado na cultural contemporânea, ainda que inconscientemente é o modo mais fácil de agir com um problema no contexto de The Walking Dead. Como matar uma criança com visíveis distúrbios mentais, ao invés de tentar tratá-la, afinal, não existia nenhum modo de fazer isso! Ou tentar matar um homem que bate em sua esposa e filhos, como o que houve entre Rick e Pete, antes do segundo matar a Reg, e por isso ser morto pelo líder do grupo, mostrando que Rick também é adepto a esse tipo de pensamento, sendo mais fácil identificar essa característica em Carol.

Mata-se um para que pessoas do grupo não morram. Ela visa o bem, isto é, o que é útil para o grupo. O grande problema dessa teórica ética desenvolvida por Jeremy Bentham, é que ela pode negligenciar consequências importantes ao julgá-las. É uma equação matemática, que desconsidera algumas variáveis que podem ser relevantes.

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(O próximo parágrafo possui spoiler da HQ #105)

A edição 105 dos quadrinhos no dá um exemplo, no qual, esse tipo de pensamento seria errôneo. Carl, na tentativa de matar Negan, se esconde num caminhão dos Salvadores, e ao sair de lá, encontra alguns capangas do vilão, e com um fuzil, os mata. Negan consegue tomar a arma do menino antes de alcançar seu objetivo. O líder dos Salvadores decide não punir o garoto, com a justificativa de gostar dele, então apenas o ameaça. Mas o principal motivo para tomar essa decisão, é evitar um confronto com o grupo de Rick.

No entanto, se Negan tivesse um histórico como o de Carol e Rick da série até o momento, os seus seguidores o questionariam pela atitude. Ou seja, se ele matasse Carl, iria iniciar uma guerra contra a Alexandria, se não o matasse, os Salvadores ficariam insatisfeitos com sua liderança, logo, qual é a melhor consequência? Como julgar corretamente? Um problema que provavelmente não teria, caso agisse duma maneira universal desde do início.

O final do sétimo episódio da 6ª temporada ainda abre espaço para outro argumento: a sanidade humana pode ser comprometida por matar para sobreviver? Após Sam perguntar “após matar, você vira um dos monstros?”, Carol responde: “A única coisa que impede você de virar um monstro é matar”. Morgan deixou essa prática porque descobriu que isso não trazia paz a ele, na verdade, não matar trazia.

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Porém, isso não torna o método de Morgan melhor. Aliás, ele também possui seus defeitos e virtudes. Pois, mostra piedade com o inimigo, assunto que está sendo discutido atualmente nos quadrinhos, mas oferece alguns riscos ao grupo que ele pertence, como mostrado no oitavo episódio da 6ª temporada. O grande problema da filosofia de Morgan é que ele não possui o conhecimento de Eastman para entender quem é tratável, como é necessário fazer esse tratamento e o ambiente no qual o tratamento aconteceria. E quem não for possível recuperar a sanidade, deverá ser morto? Como Carol e Rick fazem?

Poderíamos considerar, em partes, Morgan egoísta para preferir a sua paz antes de colocar em risco os outros? O que é exatamente o contrário do que faz Carol.

A segunda parte da 6ª temporada nos mostra que não haverá apenas o conflito físico entre Carol e Morgan como no mid-season finale. E mesmo, entendendo o passado deles, não tem como definir o melhor modo de enxergar o mundo, simplesmente, por não haver certo ou errado, mesmo que um modo possui vantagens e desvantagens em relação ao outro.

A última cena do segundo episódio já havia nos mostrado o que aconteceria: Carol e Morgan partem de caminhos diferentes, após uma tímida olhada entre si, e cruzarem o caminho, Morgan vira e vai para o caminho inverso de Carol.


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Emerson Grizotes
Emerson Grizotes
Um quase químico, que entre um cristal e uma bomba tenta ser escritor, quando não é um zumbi universitário. Acesse: https://obosquenodeserto.wordpress.com/

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